Para quem está me lendo pela primeira vez, explico.
Eu ando na rua (no transporte público, principalmente), observando pessoas. Quase todo o tempo.
Hoje, estava no ônibus usual de sempre. Eram 6:40 da manhã, indo pro trabalho, e vi uma cena. Desta vez, no ponto de ônibus. Durou poucos segundos.
Uma criança, uma menina, uniformizada e de mochila. Por volta dos seus sete anos. Ia pegar o ônibus atrás do meu.
No mesmo ponto de ônibus, uma mulher (indo para o trabalho? provavelmente atrasada?) ia pegar o ônibus em que eu estava.
Uma correu para um lado. Outra correu para o outro. E a mulher deu um encontrão na criança. Um esbarrão que quase a jogou longe. Ela – a menina – quase se desequilibrou e caiu. E ambas continuaram correndo – em sentidos opostos – em direção aos seus transportes. Às suas vidas.
E na hora pensei: quanto vale o tempo? A pressa? A gentileza?
Não vi um olhar – sobretudo da mulher – para com a criança. Ou um sorriso. Ou um pedido de desculpas. Nada.
O objetivo era pegar o ônibus. Ou algum outro (não sei). Parecia atrasada (pela pressa).
E entendo que não precisamos ser psicólogo(a)s para olhar para o outro. Para esta cena.
O quanto da nossa pressa (e do nosso tempo, e dos nossos compromissos) fecha o nosso olhar para com o outro? O quanto a nossa vida corrida, atribulada, nos deixa menos gentis (e educados)?
Ao mesmo tempo, lembro de um vídeo compartilhado no Facebook (não sei de quando é, mas o assisti ontem) em que uma mulher pára o seu carro no meio da rua reclamando das agressões que sofre do marido. Alguém gravou este vídeo. Ele estava na rede social. O vídeo tinha a duração de cinco minutos. A mulher esbravejava que o companheiro a estava agredindo. Que ela corria risco de vida (e esta mulher morreu, vítima de violência muito brutal). No tempo que durou o vídeo, não vi uma pessoa sequer parando e perguntando “oi?”.
Em época de compartilhamento, de likes, de seguidores, de insta, stories, vale mais o vídeo compartilhado (que vai gerar likes e seguidores e visibilidade) do que o anonimato do olhar e da ajuda?
Não precisa ser da área de humanas, de nenhuma profissão X ou Y para ter um olhar empático ou um olhar atento para quem cruza pelos nossos caminhos.
Em época de Setembro Amarelo, é preciso mais olho-no-olho. É preciso sair da rede social, da virtualidade, dos seus smartphones para observar mais o outro e nós mesmos. Um olhar atento para o outro é aquilo que pode nos ensinar a crescer.
[Devo dizer que na observação desta manhã, eu já fui esta mulher (e ainda sou). Na minha pressa, excluo meu olhar para quem está no caminho. E também já fui (sou) esta criança que, algumas vezes, na minha lentidão e no meu tempo mais despretencioso, já levei encontrões de outros e atrapalhei pressas alheias, e fui embora para o meu caminho sem olhar para trás].
O mais importante não é ser uma ou ser outra. Este aqui não tem gabarito. Não têm certos e errados.
O mais importante – e essencial – é o olhar para o outro e, sobretudo, para si, e ver de que forma podemos construir um nós-mesmos-melhor.