Outro dia eu vi uma cena, no ônibus, que já vi em diferentes lugares e situações. E que, desta vez, eu consegui olhar para aquilo, com um olhar atento, diferente.
Eu estava no ônibus, indo trabalhar. 7:15 da manhã.
No meu trajeto habitual casa-trabalho, muitas crianças entram no ônibus. Sozinhas ou acompanhadas. Sempre uniformizadas com o uniforme característico da escola pública do Município do RJ. O ônibus, até chegar ao meu trabalho, passa por duas.
Notei quando um menino, por volta dos seus seis anos, entrou com a mãe. Ele, antes. Ela ainda pagava a passagem. Ele sentou em um banco vazio, do outro lado do corredor, de forma que eu podia vê-lo e ouvi-lo.
E, já aquela hora da manhã, o menino chorava. As lágrimas rolavam pelo seu rosto. Ele só olhava para a frente.
Eu não sei o motivo das suas lágrimas. Mas o primeiro pensamento foi que ele não gostava de ir à escola, que lá não era um lugar feliz. E, era uma segunda-feira. Então, pior ainda para os meus pensamentos da “escola, que saco…”. Mas o motivo podia ser quaisquer outros. O do choro.
O que pude notar foi quase o constrangimento das pessoas no ônibus. O menino não fazia escândalo, não berrava. Não era birra. Era choro. Mas não-contido. Dava para ver que ele chorava, e bastante.
A mãe, por sua vez, não brigava com ele. Deixava que ele chorasse. Ela ainda pagava a passagem, com calma.
Parecia que, no tempo cronológico, isso durou 15 segundos, 30, no máximo. Para mim, foi eterno. A mãe sentou, enfim, ao seu lado, e pronto, seguimos viagem. Nenhuma palavra, nenhum olhar, nem um braço, nada.
Penso e sinto algumas coisas a respeito desse choro da criança, do menino-uniformizado-no-ônibus-na-segunda-feira-antes-da-escola:
– Os adultos do ônibus estavam constrangidos com o choro do menino. Por que nos constrangemos como a criança chora?
– Por que a primeira palavra / pensamento (dos adultos) é: “o que foi?”, “pára de chorar”, “está / vai ficar tudo bem!”
– O meu desejo de acolher o menino e trocar de lugar e poder sentar ao lado dele e passar o braço em volta e dizer: “chora aqui!” e só deixar ele chorar, acolhido.
E eu entendo que, de certa forma, existe uma dificuldade do acolhimento das crianças que vivem dentro da gente. Da nossa própria criança. Seja aquele menino / aquela menina que ficou lá atrás, nos anos 80. Seja porque eu devo acolher a minha criança hoje. Ou porque devo, também, preciso me permitir chorar, em silêncio, sem alarde, em qualquer lugar. Só olhando para frente, e esperando a hora de saltar e seguir viagem.
A pergunta que me fica é: por que não acolher, de fato, as nossas crianças? As de fora e as de dentro? Qual a dificuldade em, no silêncio, apenas abraçar e dar o nosso melhor afeto para aquele choro? Sem que precisamos saber os motivos, racionais, dos porquês, mas que possamos, apenas sentir o afeto que também nos sensibilizam.
Obrigada, menino-uniformizado, por me lembrar que existem afetos aqui, do lado de dentro, a serem disponibilizados, pelo outro, mas, sobretudo, por mim mesma.